Coluna Tiago da Silva Candido

2025, o ano em que a tela deixa de ser retangular: como a computação espacial vai redesenhar o mundo digital

De óculos inteligentes a ambientes 3D persistentes, a próxima grande onda da tecnologia não cabe mais em telas planas. E isso muda desde o design de interfaces até a forma como trabalhamos, estudamos e consumimos.

Por mais de três décadas, a experiência digital coube dentro de um retângulo: monitor, notebook, smartphone, tablet. O “mundo digital” era sempre algo que você olhava de fora.

Em 2025, essa lógica começa a rachar.
Com Apple Vision Pro, Meta Quest 3, headsets corporativos e uma nova leva de óculos inteligentes, a chamada computação espacial sai da ficção científica e entra, ainda de forma tímida, no cotidiano.

A pergunta não é mais se isso vai afetar seu trabalho ou seu negócio, mas quando — e o quão preparado você estará quando a tela, literalmente, explodir na sua frente.


O que é, afinal, computação espacial?

Computação espacial é a ideia de usar o espaço físico como parte da interface digital.

Em vez de apps presos a uma tela 2D, você passa a ter:

  • Janelas flutuando à sua frente, ancoradas no ambiente;
  • Objetos 3D com os quais você interage como se fossem reais;
  • Informações sobrepostas ao mundo físico (AR/realidade aumentada);
  • Ambientes totalmente imersivos (VR/realidade virtual) para trabalho, estudo ou entretenimento.

Na prática, o “sistema operacional” deixa de ser só a tela do seu dispositivo e passa a ser o ambiente ao seu redor.


Por que isso está acontecendo agora?

Três movimentos explicam por que 2025 é um ponto de virada:

  1. Maturidade de hardware
    Headsets ficaram mais leves, com melhor resolução, rastreamento de mãos e olhos, áudio espacial e sensores mais precisos.
    Ainda não é perfeito — longe disso — mas já é bom o bastante para uso prolongado em certos cenários.
  2. Poder gráfico e IA embarcada
    Placas gráficas e chips especializados permitem renderizar ambientes complexos em tempo real.
    A IA, por sua vez, ajuda a reconhecer gestos, mapear ambientes e adaptar interfaces ao usuário.
  3. Interesse corporativo real
    Do treinamento industrial à visualização de projetos de engenharia, empresas começam a ver economia direta: menos viagens, menos protótipos físicos, mais simulações.
    Quando entra na planilha de custo, a tecnologia deixa de ser brinquedo e vira ferramenta.

Onde isso já está sendo usado – além dos games

É fácil associar óculos de realidade virtual a jogos. Mas a computação espacial avança em outras frentes:

  • Treinamento e simulação
    Operadores de máquinas, equipes de segurança, profissionais de saúde: treinar em ambientes virtuais reduz risco e custo.
    Um erro num simulador não custa vidas nem milhões em equipamento danificado.
  • Arquitetura, engenharia e construção
    Projetos podem ser visualizados em escala real, dentro do espaço onde serão construídos.
    Clientes “entram” no prédio antes da primeira parede subir.
  • Colaboração remota
    Em vez de uma videoconferência plana, times se reúnem em salas virtuais, olhando para o mesmo modelo 3D, quadro branco ou dashboard.
  • Saúde
    Cirurgias guiadas com sobreposição de informações, estudo de anatomia em 3D, reabilitação com ambientes imersivos gamificados.
  • Educação
    Aulas de história dentro de simulações de cidades antigas, aulas de biologia dentro de um corpo humano virtual, experimentos de física em laboratórios simulados.

Games continuam sendo o grande motor cultural, mas o dinheiro “sério” já olha além.


Mudança invisível (e gigantesca): o design de interface

Quando a tela deixa de ter bordas, o design de interface precisa ser reescrito.

Alguns desafios que já estão em pauta:

  • Profundidade como elemento de design
    Não é mais só “botão, card, scroll”. Há camadas de profundidade, distância, tamanho relativo, posição no ambiente.
  • Gestos naturais vs. fadiga física
    Interagir no ar parece fantástico… até o braço cansar. Designers precisam equilibrar gestos, voz, olhar e controle físico.
  • Texto, legibilidade e foco
    Não dá para replicar um site 2D dentro de um headset e esperar boa experiência.
    Tipografia, contraste, hierarquia visual e foco de atenção precisam ser repensados.
  • Conforto cognitivo
    O usuário não está só “vendo uma tela”. Ele está “dentro” da experiência. Isso exige cuidado extra com movimento, transições e excesso de estímulo.

A área de UX para computação espacial tende a explodir nos próximos anos — e quem vier do design tradicional com curiosidade para aprender 3D terá vantagem.


O lado sombrio: vigilância, dados e fadiga mental

Toda nova camada tecnológica traz riscos. Aqui, eles são intensos:

  1. Coleta invasiva de dados
    Headsets e óculos inteligentes podem capturar:

    • Para onde você olha;
    • Como sua pupila reage;
    • Microexpressões do rosto;
    • Movimentos corporais e postura.
      Isso cria um mapa hiperdetalhado da sua atenção e do seu corpo. Em mãos erradas, é ouro para manipulação e publicidade agressiva.
  2. Vigilância no ambiente físico
    Se o dispositivo “vê” tudo à sua volta, ele também registra espaços, pessoas, objetos.
    Como ficam privacidade em escritórios, escolas, espaços públicos?
  3. Sobrecarga sensorial
    Viver num ambiente em que cada parede e superfície pode ter uma notificação, um anúncio ou um widget é um cenário perfeito para fadiga mental.
  4. Novas formas de exclusão digital
    Computação espacial tende a chegar cara.
    Ferramentas críticas de trabalho rodando só em ambientes imersivos podem criar um novo abismo entre quem tem acesso ao hardware e quem fica do lado de fora.

Regulação, ética e transparência em coleta de dados precisarão correr atrás — e rápido.


E o trabalho de escritório, muda mesmo?

A promessa é tentadora: múltiplas telas virtuais, janelas gigantes, foco total.
Na prática, os primeiros usos de computação espacial para trabalho se concentram em três áreas:

  • Multitelas sem monitor físico
    Profissionais de finanças, devs, analistas de dados e criadores de conteúdo podem trabalhar com várias “telas” virtuais, mesmo com um único notebook modesto.
  • Ambientes de foco profundo
    Headsets criando uma bolha visual e sonora, bloqueando distrações físicas e ambientando o usuário num “escritório virtual”.
  • Reuniões em 3D
    Ainda longe de ser padrão, mas avançando: reuniões em que o senso de presença é maior que em uma chamada de vídeo tradicional.

O ponto de virada virá quando:

  • o conforto físico melhorar;
  • o preço cair;
  • as ferramentas de trabalho do dia a dia (Office, IDEs, CRM, etc.) se adaptarem bem ao espaço 3D.

O que você deveria fazer agora (mesmo sem óculos na cabeça)

Mesmo que você ainda ache tudo isso distante, alguns movimentos são estratégicos:

  1. Entender conceitos básicos
    AR, VR, XR, MR, computação espacial — saber a diferença já te coloca à frente da maior parte das pessoas.
  2. Olhar para o seu setor
    Pergunta crítica: se meu mercado adotasse ambientes 3D amanhã, onde isso teria impacto direto?
    Vendas? Treinamento? Produto? Atendimento? Educação?
  3. Experimentar o mínimo possível
    Não precisa começar com o topo de linha. Usar um headset simples ou visitar um showroom já ajuda a entender o “feeling” da experiência. Teste IPTV
  4. Pensar experiências, não só telas
    Profissionais de design, conteúdo, produto e marketing: vale começar a treinar o olhar para jornadas que escapam do 2D.

A próxima internet não vai caber no navegador

Se a primeira geração da internet foi feita de páginas, e a segunda de feeds e apps, a próxima tem tudo para ser feita de espaços.

Não significa que o smartphone vai morrer amanhã.
Mas, pouco a pouco, o centro de gravidade do digital começa a deslizar do retângulo no seu bolso para o ambiente à sua volta.

A questão para negócios, profissionais e criadores é simples:
você vai esperar que isso chegue pronto à sua porta — ou vai começar a experimentar enquanto ainda é barato errar?

Tiago da Silva Candido

Colunista de portais como Correio Braziliense, Tonafama, F5 online e Imprensa e Midia e mais 1500 sites.
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