Televisão

Mídia perdida: programas, comerciais e séries que desapareceram – se lembra de algum?

A televisão brasileira viveu eras douradas de conteúdo inesquecível que capturaram a atenção e o carinho do público. Desde o surgimento de clássicos nos primórdios da tecnologia televisiva dos anos 60 até programas que marcaram os anos 2000, muitas dessas produções que marcaram décadas de nossas vidas foram, porém, perdidas com o tempo, ficando limitadas às memórias de quem assistiu. Emissoras como SBT, Rede Globo, a extinta TV Manchete, entre tantas outras, trouxeram histórias, programas de auditório, quadros humorísticos e comerciais icônicos que se tornaram símbolos de suas épocas, mas que hoje não têm mais registros completos. Nem mesmo plataformas de streaming como a Globo Play e SBT Vídeos possuem o catálogo completo, levando a uma sensação de nostalgia frustrante para quem deseja revisitar esses momentos, principalmente para um público cansado da falta de controle e posse do conteúdo dos streamings, como mostra a ExpressVPN. Refresque sua memória e confira os principais exemplos da mídia perdida na televisão brasileira e mundial.

Mídia que a televisão brasileira perdeu ao longo do tempo

            Seja por limitações da tecnologia da época, custo elevado de produção, a precariedade de determinadas instalações, acidentes graves ou até mesmo a falta de interesse em sua preservação, as emissoras brasileiras possuem incontáveis exemplos de programas famosos ou até momentos históricos que foram completamente perdidos:

A Rede Tupi, pioneira da TV no Brasil, sofreu grandes perdas em seu acervo, já que nos anos 1950 as gravações eram raras devido ao alto custo do cinescópio. Restaram apenas alguns fragmentos importantes, como o especial “TV na Taba” e apresentações de Hebe Camargo e Ivon Curi. Telenovelas famosas, como “Beto Rockfeller”, “A Viagem” e “Éramos Seis” estão parcialmente preservadas, embora muitas tenham capítulos faltando. Em 1985, a Cinemateca Brasileira resgatou fitas deterioradas da emissora, incluindo a histórica entrevista de Chico Xavier no “Pinga-Fogo.” Outro resgate importante foi um raro trecho de 1 minuto e 40 segundos do especial dos Jackson Five de 1974.

A Rede Globo também sofreu perdas, especialmente em seus primeiros anos, devido a incêndios e ao reaproveitamento de fitas. Além das novelas “Selva de Pedra” e “Irmãos Coragem” que restaram apenas em versões compactas, houve perdas em produções icônicas como “Gabriela,” “Dancin’ Days” e “Escrava Isaura” cujos episódios estão incompletos ou danificados. Programas como “Chico City,” “A Grande Família” e esquetes de “Faça Humor, Não Faça Guerra” sobreviveram em número limitado. Os registros esportivos e jornalísticos da Globo também sofreram perdas significativas; reportagens e coberturas históricas, como a estreia de Glória Maria no “Jornal Nacional” cobrindo a queda do Elevado Paulo de Frontin, foram totalmente perdidas. Em sua plataforma de streaming, a Globo Play, a emissora passou a restaurar através do uso de tecnologias de IA e remasterização alguns episódios anteriormente inacessíveis de sua programação clássica – no entanto, muitos ainda sofrem com problemas de qualidade ou segmentos completamente perdidos que precisaram ser recortados da narrativa.

A Record, por sua vez, teve parte significativa de seu acervo destruído em incêndios e devido à reutilização das fitas de gravação. Programas musicais icônicos como “O Fino da Bossa” e “Jovem Guarda” desapareceram quase por completo, sobrando apenas alguns trechos. Entre os poucos arquivos resgatados, estão episódios da sitcom “Família Trapo” e registros do “Festival de Música Popular Brasileira” incluindo a famosa final de 1967. Parte do acervo dos anos 1980 foi recuperado graças ao trabalho de colecionadores e ao Instituto Ressoar.

A TV Excelsior perdeu a maioria de seus arquivos em um incêndio devastador em 1969. Apenas cerca de 100 fitas foram encontradas anos depois nos arquivos da TV Globo e da TV Gazeta, incluindo cenas de novelas como “Redenção” e “A Muralha” e uma rara apresentação de Ray Charles em 1963. Esses registros foram restaurados e doados à Cinemateca Brasileira, preservando uma pequena parte da história da emissora, que foi uma das mais inovadoras de seu tempo.

A Rede Bandeirantes também teve perdas históricas, especialmente com incêndios e reutilização de fitas nos primeiros anos de existência. Restam apenas pequenos registros de programas como “Buzina do Chacrinha”, “Clube do Bolinha” e “Cozinha Maravilhosa da Ofélia” A emissora possui, contudo, um rico acervo esportivo com gols e narrações icônicas de Luciano do Valle. A Band guarda ainda todos os debates eleitorais, incluindo o histórico primeiro debate presidencial de 1989, com mediação de Marília Gabriela.

No SBT, muitas gravações das décadas de 1980 e 1990 foram perdidas em enchentes e pela falta de política de arquivamento até 1996. Apesar disso, a emissora conseguiu preservar boa parte de programas como “A Praça é Nossa” e gravações do Programa Silvio Santos, incluindo cenas raras dos anos 1960. A emissora lançou recentemente o +SBT, seu serviço de streaming, que resgatou e disponibilizou clássicos como “Topa Tudo por Dinheiro” e “Porta da Esperança.”

A Rede Manchete perdeu grande parte de seu acervo após sua falência, mas algumas novelas icônicas como “Pantanal” e “Xica da Silva” foram preservadas e reexibidas em outras emissoras. Em 2021, 25 mil fitas da Manchete foram leiloadas, mas o acervo permanece em um imbróglio judicial quanto aos direitos de exibição, e muito do material acabou nas mãos de colecionadores. A RedeTV!, que sucedeu a Manchete, manteve alguns registros, mas grande parte da história da emissora original se perdeu.

A mídia perdida não existe apenas no Brasil

A perda de arquivos televisivos também aconteceu em várias partes do mundo, especialmente entre as décadas de 1950 e 1970, quando a gravação de programas ainda era cara, e as emissoras frequentemente reutilizavam fitas. Um dos casos mais famosos é o da série britânica Doctor Who. Nos anos 1960 e 1970, muitos episódios, principalmente dos arcos protagonizados pelos primeiros Doutores (William Hartnell e Patrick Troughton), foram apagados pela BBC para liberar espaço. Ao longo dos anos, fãs e colecionadores recuperaram algumas dessas fitas, mas aproximadamente 97 episódios permanecem oficialmente perdidos. Para preencher essas lacunas, a BBC usou versões de áudio, animações e reconstruções fotográficas, criando um arquivo alternativo de episódios que resistiram ao tempo de maneira não convencional.

Outro exemplo emblemático é a perda de registros da televisão americana. Muitos episódios das primeiras temporadas de programas como The Tonight Show com Johnny Carson foram apagados, restando apenas gravações a partir de 1972. Esse problema também afetou shows de variedades e gravações ao vivo, como apresentações de Elvis Presley e outras celebridades da época. Nos anos 1950, a NBC apagou episódios do show Your Show of Shows, estrelado por Sid Caesar, considerado um dos primeiros grandes programas de comédia. Esse histórico de perdas reflete como a preservação de mídias televisivas ainda não era prioridade e como acervos importantes, que poderiam oferecer um olhar único sobre a história da TV e cultura pop, foram deixados para trás. Atualmente, o impacto da falta de preservação do início do cinema e televisão é bastante lamentado por pesquisadores e fãs que, muitas vezes, dependem de gravações amadoras ou relatos baseados apenas nas lembranças de quem assistiu ao conteúdo original.

A preservação da mídia ainda é um problema

O processo de preservação da mídia no Brasil é desafiador e enfrenta limitações em todos os níveis. Muitas produções foram arquivadas sem condições de segurança, e até mesmo formatos como as fitas Betamax e VHS, comuns entre os anos 70 e 90, são difíceis de preservar devido à deterioração natural dos materiais. Fitas reutilizáveis, comuns no Brasil, também colaboraram para o desaparecimento de programas. Na época, era comum gravar novos programas sobre fitas já usadas, apagando registros antigos, para economizar na compra de novas fitas – que eram caras e pouco acessíveis.

Mesmo no mundo moderno onde as produções digitais podem ser copiadas de forma instantânea e em qualidade original, a preservação de mídia para o futuro ainda é muito impactada pela falta de interesse e esforços de conservação e cópias. Por exemplo, grande parte do acervo do conteúdo criado no YouTube brasileiro já está perdido – os primeiros vídeos de figuras que hoje são de grande importância, como o Felipe Neto, não podem ser facilmente encontrados em qualidade original. Vídeos de personalidades como a Nostal_Gi, BRKSEDU, Lolly, Maicon Kuster e outros também já foram apagados antes que cópias fossem criadas pela comunidade. O universo dos jogos digitais é ainda mais complicado: CDs interativos da Turma da Mônica, jogos eletrônicos de portais como o Cartoon Network online e IGuinho, e até mesmo especiais promocionais de franquias como o McDonald’s foram perdidos.

Um exemplo curioso é a promoção conjunta criada pela emissora Cartoon Network e as empresas Kellog’s, Bical e Bob’s: as empresas realizaram um sorteio promocional para que uma criança brasileira fosse transformada em uma personagem do desenho animado “K.N.D A Turma do Bairro”, bastante popular no país. A vencedora Sâmala recebeu um DVD com um episódio do desenho contendo um personagem desenhado a sua imagem, e com poderes e habilidades baseados em sua personalidade – no entanto, ao ser contadada por preservacionistas que queriam uma cópia do conteúdo, a brasileira comenta que o DVD foi danificado e não pôde ser recuperado, ou seja, as imagens existem apenas em sua memória.        

A preservação da mídia – tanto analógica quanto digital – é fundamental para que tenhamos um registro da história do entretenimento, além de apresentar os clássicos de nossa infância às novas gerações e termos a possibilidade de matar a saudade daquilo que consumiamos no passado. Apesar dos desafios, os esforços de preservação de grupos como a  Cinemateca Nacional, a comunidade Lost Media Brasil em plataformas como o Reddit e os esforços de uma série de pesquisadores estão, aos poucos, reconstruindo as memórias perdidas da mídia brasileira.

Foto: Freepik

Botão Voltar ao topo