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De memes a hits: astrologia viraliza nas redes sociais

Jovens buscam nos astros explicações que o conhecimento tradicional não oferece e impulsionam o fenômeno digital

Com pitadas de humor e uma boa dose de memes, a astrologia tem conquistado espaço nas redes sociais no Brasil e no mundo. Perfis como @notallgeminis, criado pela roteirista norte-americana Courtney Perkins, acumulam centenas de milhares de seguidores ao postar conteúdos que misturam cultura pop, situações cotidianas e informações sobre os astros.

O fenômeno é uma forma de ressignificar uma prática milenar, agora adaptada à era digital, e marcar uma mudança geracional na forma como a astrologia é vista. Segundo a revista New York Magazine, os jovens buscam nos astros explicações que a ciência tradicional não oferece, muitas vezes, partindo de memes para uma consulta de mapa astral profissional.

E a demanda é grande. Perkins, por exemplo, desenvolve seis memes em 30 minutos. “Começo com a imagem. Se a foto é engraçada, as ideias surgem”, explica em entrevista ao The Fader. Conteúdos mais elaborados exigem horas de trabalho. Ela cria versões para cada um dos 12 signos, garantindo representatividade para todo o zodíaco.

O formato também tem feito sucesso no Brasil. Com uso de gírias regionais e referências à TV brasileira, o criador de conteúdo Vítor de Castro, do @debocheastral, mostra como cada signo reagiria em situações típicas do cotidiano brasileiro para mais de 643 mil seguidores.

Já perfis como o de Rafaella Tuma (@rafaellatuma) representam outra vertente: famosa por criar animações com base em áudios que viralizam na internet, os signos também marcam presença no perfil da artista, que soma 7 milhões de seguidores.

Como os memes criam senso de pertencimento

O fenômeno é identificado como micro-targeting: estratégia que mira características de identidade pessoal. Dessa forma, funciona de forma semelhante aos testes de personalidade que eram febre na época das revistas ou no auge do Facebook, por volta de 2010, mas com alcance ampliado. Cada meme cria senso de pertencimento ao abordar traços comportamentais reconhecíveis, como explicam os próprios criadores de conteúdo.

“As pessoas usam astrologia como veículo para compreensão”, analisa Cori Amato Hartwig, administradora do @manicpixiememequeen, perfil de memes sobre astrologia. Na avaliação de Perkins, a busca por conexões autênticas impulsiona o interesse do público.  “É terapia gratuita. Oferece espaço para explorar aspectos pessoais, refletir sobre relacionamentos e padrões de comportamento.” 

 Criadores nacionais encontram fórmula própria de sucesso

Criadores nacionais desenvolveram uma linguagem própria para memes astrológicos. Enquanto os perfis internacionais citam cultura pop global, os brasileiros incorporam situações do dia a dia típicas do país. Novelas, músicas populares e acontecimentos locais viram base para o humor com astrologia.

[sugestão de link para incorporar no texto https://www.instagram.com/rafaellatuma/reel/DJ__AXXxoFz/]

O engajamento com memes pode ser o primeiro passo para a busca pelo conhecimento mais aprofundado em sites especializados. Desse modo, é possível que seguidores que começam curtindo memes busquem serviços como interpretações personalizadas, leituras de mapa natal e uma sinastria amorosa completa. O entretenimento pode abrir portas para a procura do conhecimento especializado.

 

Com grandes sucessos, grandes responsabilidades

O sucesso sempre traz complexidades, e na internet não é diferente. Criadores se tornaram curadores culturais involuntários, com alguns investindo no melhor curso de astrologia disponível para fundamentar tecnicamente o conteúdo que produzem. Com grandes audiências, são capazes de influenciar as percepções sobre personalidades e comportamentos sociais. 

Perkins enfrenta críticas constantes sobre figuras públicas incluídas em seus memes. “Sempre recebo mensagens sobre coisas negativas que essas pessoas fizeram”, conta. Já Hartwig vê a astrologia digital como filosofia inclusiva. “Não se importa com sexualidade, identificação de gênero, raça ou classe econômica”, declarou à New York Magazine. Essa universalidade explica parte do apelo dos memes astrológicos.

‘Caos’ moderno impulsiona retorno aos astros

A autora sueca Liv Strömquist conecta o ressurgimento astrológico à instabilidade atual. “A vida contemporânea é extremamente imprevisível. As coisas acontecem de forma aleatória”, declarou à revista Quatro Cinco Um. “São tempos apocalípticos, como se não houvesse futuro. É difícil acreditar no que vem por aí. E a astrologia é uma forma de se relacionar com isso.”

Strömquist assina a HQ “A astrologia”, que também mistura humor com uma abordagem crítica ao tema. Ela conecta a incerteza e a busca por explicações místicas. “Há muita insegurança e, de alguma forma, a astrologia parece tão plausível quanto qualquer outra coisa”, pondera a socióloga, referindo-se às questões contemporâneas como Inteligência Artificial, mudanças climáticas e instabilidade política.

Parte dos jovens encontra nos astros a “estrutura” que falta no mundo real; há conforto nas categorias oferecidas pelos signos. “O que realmente está no cerne da astrologia é o interesse pelos humanos. A ideia é que somos de alguma forma governados pelos planetas, astros e constelações, mas ninguém fala sobre esse aspecto. Falamos sobre relacionamentos, pessoas e como elas são”, reforça Strömquist. 

“E esse é um tópico de grande interesse: entender quem eu sou, quem é essa pessoa… É uma maneira divertida de analisar as personalidades. A astrologia é essa linguagem social para discutir como as pessoas são, o que é sempre um ótimo assunto”, conclui a autora.

Tiago da Silva Candido

Colunista de portais como Correio Braziliense, Tonafama, F5 online e Imprensa e Midia e mais 1500 sites.
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