
“Aos 24 anos, eu era a filha perfeita. Ginecologista respeitada, casada com um homem, que dizia sim para todos, colega de todos no hospital. Até que um parto humanizado mudou meu jeito de enxergar a vida.” Foi assim que começou um dos episódios do Bom dia, Obvius, um podcast que eu amo acompanhar, apresentado pela jornalista Marcela Ceribelli.
A entrevistada e dona da frase marcante foi Marcela Mc Gowan, que ficou nacionalmente conhecida pela participação no BBB20. É ginecologista e obstetra, com formação em sexualidade humana e terapia sexual. No bate-papo, elas trouxeram reflexões incríveis, mas foi o ponto de partida daquele episódio que me inspirou a escrever este texto.
Desde pequenas, nos ensinam que ser uma “boa mulher” significa agradar, ceder, ser compreensiva e, acima de tudo, dizer “sim”. Sim para padrões inalcançáveis de beleza, sim para relacionamentos que nos sufocam, sim para a sobrecarga de responsabilidades, sim para o medo de desagradar. E assim, passamos a vida encenando, sendo marionetes do mundo, sem saber quem somos nós de verdade. Já parou para pensar nisso?
Quem é você quando não recebe os parabéns pelos inúmeros “sins” que disse quando queria dizer “não”? Quem é você quando sorri e concorda, mesmo com um nó na garganta? Quando aceita um convite que não queria, quando assume uma responsabilidade que não é sua, quando permite que ultrapassem seus limites porque teme desagradar?
Quem é essa mulher que se encolhe para caber no espaço que lhe deram? Que coloca as vontades dos outros acima das suas e acredita que seu valor está em ser querida, aceita, validada?
Já parou para pensar qual é o motivo de fazermos isso? Seria medo? Medo de ser vista como egoísta, difícil, inadequada? Medo de ser a vilã da história? Medo de que o amor e a aceitação venham com condições? Mas e se, a partir de agora, começássemos a dizer “não”?
Os primeiros “nãos” vão doer em você e assustar quem está do lado. Fica quem te ama de verdade, repele quem está contigo por conveniência. Hoje, meu convite é para você fazer uma autoavaliação. Mergulhe dentro de você para descobrir quem é você de verdade. Porque, na real, agradar o mundo inteiro não é uma prova de amor, mas uma sentença de aprisionamento. Ao viver para os outros, quem cuida de você? Quem ouve seus próprios “nãos” sufocados?
Dizer “não” não é um ato de rebeldia sem causa, mas de sobrevivência e resgate da nossa identidade. Quando nos dobramos aos padrões impostos por uma sociedade machista e patriarcal, pouco a pouco perdemos a nós mesmas. Deixamos de lado nossos desejos, calamos nossas opiniões e passamos a atuar em um papel que não escolhemos, apenas para sermos aceitas.
O “não” liberta. Ele nos tira da obrigação de corresponder às expectativas alheias e nos devolve o direito de escolher o que nos faz bem. Ele nos lembra que não somos menos mulheres por não sermos dóceis o tempo todo, por não desejarmos ser mães, por não querermos um corpo magro ou curvas voluptuosas. Ele nos fortalece para dizer que nosso valor não está na aprovação dos outros, mas na nossa própria aceitação.
Então, que aprendamos a dizer “não” sem culpa. “Não” para o que nos anula, “não” para o que nos diminui, “não” para o que nos torna personagens de uma história que não escrevemos. E, acima de tudo, “sim” para nós mesmas.
